130 coisas sobre as quais escrever #63 [Texto de Helena Agelos]


63. Escreva sob o ponto de vista de alguém que tem sinestesia.

Acordei com o barulho estridente do despertador, que trazia um cheiro de leite ao meu quarto: Era mais um dia normal. Levantei contra a minha vontade e vesti o uniforme da porta do inferno, era como chamávamos. O celular não havia carregado durante a noite, ótimo. Engoli uma fatia de pão seco com um resto de margarina e meus sentidos se misturaram em cores. Escovei os dentes e me agasalhei para enfrentar um frio que me trazia à boca o amargo de um café puro. 
Dentro do ônibus, tirei a maioria das blusas e afins que estava vestindo, por conta do calor humano. Como sempre, olhei a paisagem do caminho e estava tudo normal, mesmas árvores, mesmas casas. Em certo ponto do caminho, o motorista virou em uma rua desconhecida e meu coração acelerou. Perguntei a uma moça qual ônibus era aquele e descobri que estava indo para o lugar errado. Tentei conter meu desespero sem sucesso, desci no ponto mais próximo e estava completamente perdida, naquele horário da manhã quase ninguém estava na rua. 
Voltei à rua principal para, pelo menos, saber onde eu estava e tentar pegar o ônibus certo. Nesse momento, o amargo do frio estava forte e passava pelo meu moletom enquanto eu esperava no ponto. Vi um ônibus vermelho vindo e me enchi de esperança, a ponto de esquecer do frio, era o que eu tinha que tomar. Fiz sinal para que ele parasse, mas logo me desesperei novamente: ele iria virar na outra rua. Meu reflexo me fez começar a correr para o próximo ponto e torcer para que o motorista estivesse de bom humor. Corri e senti todo o ar gelado se tornar escasso. Quando finalmente entrei no ônibus certo, vi um pequeno sorriso no rosto daquele motorista e, finalmente, pude achar graça daquela situação desesperadora.

Depois disso, me senti até um pouco mais disposta do que estava antes, mesmo o trabalho não sendo tão animador.

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