O que mais me impressiona neste mundo é a Vida. Ela é como uma personagem secundária, atuando neste imenso universo. Eu vivo nessa peça, a Vida me comanda. No palco, eu atuo por ela. Eu a vejo como uma entidade pequena, que parece fraca e nula, mas não que isso seja um problema. A sua sutileza e extravagância cria sub atores monumentais, que a auxiliam a demonstrar a sua grandiosidade. Desses sub atores, posso citar o ser humano, os microrganismos, os animais e talvez os alienígenas. Mas das minhas parceiras favoritas, com certeza, aponto as árvores. Se um dia eu encontrar problemas para atuar, quando a Vida não me der o devido apoio no decorrer de minha jornada, eu, como quem não quer nada, experimentarei me juntar ao espaço de uma árvore. Quando esse momento chegar, bilhões de coisas fantásticas acontecerão a cada segundo, mas mesmo que eu não possa apreciar toda essa arte, poderei ainda ter o mais belo aprendizado que a vida pode nos proporcionar: a sutileza, a sintonia e a bravura.
Todas as árvores são maravilhosas, graças à sua natureza de suporte. Serve de suporte para tudo. Sombra, caso o sol esteja escaldante; oxigênio, para nossa respiração; glicose, para a sobrevivência dos fungos; frutos, para a sobrevivência dos animais e também seu tronco, infelizmente, para construções humanas, e de alguns animais, como o castor. Sem dúvida, ela é de grande importância no papel da manutenção dessas peças da vida. Como se não fosse o suficiente, a árvore tem posse de uma beleza única, que gosto de comparar com a própria Vida. Ela parece fraca, quieta e condenada à morte, mas na realidade, é um que muitas vezes é o mais forte. Ela é graciosa. Lindo é ver suas folhas balançando ao vento, suas flores se abrindo na primavera de setembro, as abelhas e os beija-flores fazendo uma visita a todo momento. Aqui aprendi a sintonia. Elas têm um papel no mundo. Elas são importantes. Não é necessária a posse da razão: é preciso apenas redefinir suas prioridades e suas necessidades. Assim, todos podem sair ganhando com suas atitudes.
Decido, então, fazer uma visita ao parque para esfriar a cabeça. Passo por um momento difícil de minha jornada. Minha filha está com problemas com sua namorada e está deprimida, e meu pai está internado no hospital com suspeitas de uma pneumonia muito grave e, devido à idade, com poucas chances de sobrevivência. Coisas da Vida. É o jeito de ela brilhar no teatro do universo. Aproximo-me de uma árvore e me sento ao lado de seu tronco. Vejo uma borboleta pousando em meu ombro direito e, logo em seguida, subindo para pousar em uma folha. Nessa folha, cai, de outra folha, uma gota d’agua, mas não em cima da pequenina. Essa, então, bebe a água. Assim, em questão de segundos, paro e penso comigo mesmo quão bela foi aquela cena. Tudo nessa árvore. Tenho certeza de que se voltasse outro dia, eu veria uma mamãe pássaro chocando seus ovos em um ninho dentro daquela copa gigante, ou talvez um pica-pau abrindo alguns buracos acima de minha cabeça. O mais incrível é: cheguei ali sem nenhuma esperança, mas mesmo assim, toda essa energia que aqui flui foi capaz de diluir todas as minhas mágoas, e assim como uma brisa de vento, como um banho de águas calmas, foi capaz de reagrupar todos os pedaços da minha alma machucada.
Aquela árvore, assim como todas as outras, entrega tudo o que se pode imaginar ao mundo, referente aos seus recursos e esforços, e para mim, isso é arte. A mais pura arte. Não pode ser reproduzida a não ser por outra árvore. É aqui que aprendi a sutileza.
Os tempos são melhores, e agora minha filha se casou com sua esposa. Que casal lindo! O namoro foi resolvido e, além de casadas, pensam também em adotar um bebê! Atitude belíssima!... No entanto, infelizmente, meu pai faleceu de complicações cardiorrespiratórias cinco dias depois que sentei ao lado daquela árvore. Acredito que se eu não tivesse ido ao parque antes da morte de meu pai, eu não teria aguentado o peso em minhas costas e teria desistido da vida. Lentamente aquela esperança que recebi de presente da árvore se transformou em paz, e como essa paz me ajudou naquele momento. O momento da ligação do hospital. Foi o silêncio mais quieto. O corpo mais parado. O tempo mais lento. Nenhuma lágrima. Apesar da morte, ali vivi a paz. Assim como naquele encontro com a árvore. Apenas sorrisos e lembranças da infância, das crianças. O tempo estava indefinido. Passado, presente e futuro. Sem preocupações... Aquela borboleta.
Volto ao parque. É inverno e tudo está branco, todas as outras árvores estão secas, recolhidas. Tudo parece morto, exceto aquela árvore. Não sou nenhum botânico, portanto nunca me interessei em observar espécies de árvores, mas ali era mais que evidente, era gritante. Aquela árvore, onde vivenciei a melhor experiência da minha vida, se tratava de um ipê. Um ipê roxo, acho. Extravagante! Aquele roxo, as folhas verdes e o tronco forte e poderoso, como se nada importassem os três graus negativos que fazia. Ela, mesmo no frio congelante, entrega centenas de flores vibrantes ao mundo, mesmo que quase nenhum animal possa apreciá-la nesse momento de sobrevivência. Como ela consegue se destacar nas condições mais improváveis? Parece que agora eu entendo tudo. Sua razão de existir, sua sintonia, sutileza e, principalmente, sua bravura. Ela é como um ser especial, uma entidade pequena, mas com grande poder. Ela é a força em meio à fraqueza. O brilho em meio à escuridão. O equilíbrio em meio ao caos. O ponto central no plano infinito. Dou-me conta de que vivenciei o seu maior ato de bravura. Aqui, ao redor deste tronco, aconteceu a deixa da Vida no teatro do universo.
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